Política e Prazeres

Já que o poder é afrodisíaco.

domingo, julho 13, 2008

Hoje, em WM

A carta de Djalma – 2
Datada de 5 de abril de 1971, o ex-prefeito de Natal, Djalma Maranhão, exilado no Uruguai, escreveu uma carta endereçada ao advogado Ademar Rubens de Paula, parente e amigo, residente em São Paulo, também natalense. A carta foi escrita em papel timbrado do Centro Del Turista Brasileño, localizado na Plaza Independência, Montevideo, Uruguay. Está datilografada em lauda e meia, 76 linhas, mais um “Em tempo”, de 7 linhas, totalizando 83, espaço 1, média de 72 batidas por linha. Há erros datilográficos, palavras rasuradas, letras trocadas, todos os cacoetes adquiridos de escritas por jornalistas nas redações de antigamente. Três meses e vinte e um dias depois, Djalma Maranhão morreria. Vai a carta:
“Montevideo, 5 de abril de 1971Meu caro Ademar:Quando você esteve aqui, amando e fazendo turismo, demonstrou sincero interesse em ajudar este seu velho parente e amigo, na hora difícil em que vive, exilado da Pátria e longe da família, lutando intensamente para sobreviver economicamente com dignidade.A oportunidade acaba de surgir. Como você sabe, tenho um Centro Del Turista Brasileño, que já foi Agência de Viagens e atualmente funciona como representante de revistas e jornais, particularmente brasileiros, e assessorando em matéria de turismo hotéis e órgãos interessados no intercâmbio turístico entre o Brasil e o Uruguai.Representamos Bloch Editores S. A. Com a sua cadeia de revistas MANCHETE, FATOS E FOTOS, DESFILE, PAIS E FILHOS, etc. O CORREIO DA MANHÃ, do Rio de Janeiro. A Cia. Jornalística CALDAS JUNIOR, editora do CORREIO DO POVO, FOLHA DA TARDE e FOLHA DA MANHÃ, de Porto Alegre. Somos Correspondentes do JORNAL DE TURISMO, do Rio de Janeiro e de PRENSA CONTINENTAL da Argentina, além de outros jornais e revistas.Desde algum tempo vínhamos tentando uma representação de São Paulo. Agora surgiu a oportunidade. O ESTADÃO está disposto a nos entregar a distribuição de sua venda avulsa aqui no Uruguai. Faz, entretanto, uma exigência, cousa que conseguimos superar nas outras representações: UMA FIANÇA. Acontece que nas outras representadas, o pessoal nos conhece. No Estadão ninguém sabe quem somos. E vem, então, a exigência da fiança. E esta representação nos interessa. São uns 200 cruzeiros mensais (quando a venda estiver normalizada) ao incorporar ao nosso orçamento. É o caso de lançar sangue pela bôca para conseguir o objetivo, pois aqui as oportunidades são pouquíssimas para se ganhar mais alguns pesos. É preciso tirar água da pedra...Minha aposentadoria ainda não saiu. Dária foi para Natal para ver o que é possível fazer.Vamos ao concreto. Você tem toda liberdade para dizer SIM ou NÃO. Continuará a contar com minha amizade, qualquer que seja a decisão.Poderia você dar-me esta fiança? São 3 (três) mil cruzeiros novos. E também referências e fichas bancárias, comerciais, etc, sobre a sua pessôa.Não tenha receio de prejuízo, pois até hoje, o grande patrimônio da minha vida é a honestidade. Prefeito de Natal duas vezes, vítima de devassas e mais devassas, não conseguiram colocar uma mancha no pulmão sadio das finanças municipais! Lembro-me bem que um dos encarregados dos famosos ipms, o encarregado do mesmo, frente a elevado número de oficiais, afirmou: “Sabemos que o senhor é um homem honesto, pena que seja um subversivo”. Subversivo porque alfabetizava as crianças da minha cidade. A prova concreta da honestidade é que se eu fosse um desonesto não estaria hoje transformado em vendedor de jornais.Examine o assunto. Caso possa prestar-me esta colaboração, muito lhe agradeceria. Mas, se motivos particulares não seja possível atender-me, fique certo de que não lhe guardarei nenhuma mágoa. A amizade e admiração pelo menino louro, ponteiro do Alecrim F.C., que um dia viajou de Natal para enfrentar e vencer em São Paulo, continuarão de pé.Peço somente uma cousa. Responda com urgência esta carta, principalmente se for negativa a solução, fim de que possa tentar outra providência.Sendo positiva sua definição, pediria que encaminhasse ao “O Estado de São Paulo” a carta anexa, dirigida ao Dr. Júlio Mesquita Neto, juntamente com a fiança, sua ficha bancária e referências comerciais, etc. Anexo, também, algumas folhas de papel timbrado, em branco, para você preencher as referidas referências e para qualquer outra necessidade.A carta dirigida ao diretor do “O Estado de São Paulo” é para facilitar os trâmites. Em vez de você mandar as referências para aqui e eu ter que devolvê-las para S. Paulo, o assunto seria solucionado definitivamente aí.Sei que você é a pessoa indicada para “quebrar este galho”, com o mundo de relações que possui nesta fabulosa gleba paulistana. Não é para isto que você é merecidamente presidente do Centro Norte-riograndense, Conselho do São Paulo e outros bichos...Agora trataremos de assuntos mais amenos. Como vão estes marginais da colônia papa-jerimum? O tribuno Morelli, o jornalista Bira, o cineasta Arnaldo e o restante da turma? Receberam meus cartões?E a sua noiva? Não tenha ciúme, pois já estou quase de fogo-morto... Mas, se fosse um solteirão com uns 40 anos quem casava com ela era eu... Falando sério, você é um boboca que está perdendo uma magnífica oportunidade de ganhar uma magnificentíssima esposa. É uma moça simpática, educada e que nos deixou (a mim e a minha mulher) a melhor impressão. O diabo é que não me lembro do nome. Como é mesmo que ela se chama? Um abraço duplo, para você e para ela, do amigo de sempre que fica aguardando, com a possível brevidade, suas notícias.Djalma Maranhão.
Em tempo: Caso haja indagações sobre minha pessoa você poderá responder de duas maneiras: Uma é dizer simplesmente que se trata de um parente que está radicado em Montevidéo e exerce as funções de gerente do Centro Del Turismo Brasileño. A outra é informar que se trata de um político exilado, Prefeito de Natal duas vezes, ex-Deputado Federal e como jornalista foi Diretor do jornal de Café Filho, quando o mesmo exercia a Presidência da República”.